12.9.06

VÍCIO


Michael Mann é um diretor que eu 'tive que engolir', como diria um ex-técnico da seleção brasileira. Eu via Miami Vice em sua época (na TV uruguaia, por sinal, com direito a dublagem en español), achava a série legal, mas um tanto quanto superficial e clipada. Não em empolguei nem um pouco quando seu executivo virou diretor de cinema... fui obrigado a reconhecer o talento, no início um pouco a contragosto, achando que podia ser acidente, algum assistente competente... no caso de Miami Vice, o filme, ele confirma várias qualidades que já podiam ser vistas nos filmes anteriores... a facilidade de criar climas estupendos, a sensível direção de atores (culminando numa caliente cena de sexo entre o criticado Colin Farrel e a lindona Gong Li... ela 'chorando no ato' foi uma das cenas mais sensuais qeu vi no cinema esse ano) e excepcionais cenas de ação. Aqui me surpreendi com como o filme tem relativamente poucas cenas de ação, se concentrando na preparação para as mesmas.

Li muitas críticas à atuação de Colin Farrel... curiosamente foi uma das coisas do filme que eu mais curti. Frio, discreto, ele é um personagem mais interessante da obra, contrastando muito bem com o mais elétrico Jamie Foxx. Aliás, uma das críticas daqui de Porto Alegre concentrou-se no visual de cantor de bolero utilizado pelo ator irlandês na película (com aqueles mullets típicos dos Allman Brothers)... se ele tivesse que parecer com modelo realmente aquele look estaria equivocado, mas ao que eu me lembre ele deveria se infiltrar entre os traficantes, logo ele estar um perfeito chinelão é até recomendável. Outra crítica portoalegrense reclama que 'os personagens parecem super heróis, dirigem aviões, atiram como cowboys...' também, que eu me lembre eles são agentes do FBI, logo o exame para ingresso nessa tropa de elite é um pouco mais difícil que fazer o quatro e contar até dez... se os agentes em questão devem se infiltrar entre os traficantes, não me parece absurdo eles tirarem um brevê...

Também chama atenção o trabalho virtuosístico de fotografia, a cargo de Dion Bebee... o trabalho com a câmera digital Thompsom Viper (já utilizada por Beebe em 'Colateral') é simplesmente excepcional, e acaba contribuindo para o look realista e naturalista pretendido. Curti muito ver Ciudad del Este, no Paraguai, com todo seu visual sujo, em um filme 'de primeiro mundo'.

A DAMA

É difícil criticar um filme de M. Night Shyamalan (Chalaião, como vou me referir a ele no resto do artigo, para os íntimos). Depois de três filmes impecáveis (O Sexto Sentido, Corpo Fechado e Sinais) aparentemente ele começou a acreditar nas resenhas que a imprensa chapa branca fazia dele, que ele seria o novo Hitchcock, e deu uma derrapada sem tamanho em 'A Vila', duas horas e meia de discussões sobre o sexo dos anjos. Por mais que as coisas melhores um pouco em 'A Dama na Água', o negócio continua longe de ficar legal. O maior dos problemas parece ser falta de modéstia... afinal, o cineasta viver um escritor que irá escrever um livro que mudará a história do mundo não é exatamente uma demonstração de simancol. O filme conter alguns dos piores diálogos escritos nos últimos anos também não.

Desperdiça-se os atores (em especial os protagonistas, Paul Giamatti e Bryce Dallas Howard, mais o comediante Bob Balaban) em uma espécie de teatro mambembe excepcionalmente bem fotografado (por Christopher Doyle, que trabalha com Wor Kar Wai, e Zhang Ymou, em seu segundo filme ocidental desde 'Psicose', o de Gus van Sandt) que simplesmente parece estar mais preocupado em agradar ao umbigo do diretor que em contar uma história interessante e coerente para o público. ‘É para ser uma fábula’, diz o diretor em entrevistas... uai, então faz direito, acha o clima correto prá fazer isso. Do jeito que ficou, tudo está no meio do caminho: é sério e solene demais para ser um filme infantil e bobo demais para ser levado a sério por adultos (que iam adorar, por exemplo, que o corpo de Bryce Dallas Howard fosse mostrado de forma mais detalhada). Diálogos como ‘oi, eu sou uma narf’ só fazem sentido para crianças muito pequenas... aliás, essas crianças pequenas provavelmente não vão entender a vendetta pessoal do Chalaião contra os críticos de cinema, personificado aqui por Bob Balaban. Senti saudade do modo que Joe Dante lidou com o assunto, em ‘Gremlins 2’, que pelo menos era divertido e não podia ser classificado como gratuito.

Chalaião tem solução? Provavelmente tenha... Joel Schmacher fez ‘Phone Boot’ e ‘Tigerland’ depois da catástrofe que foi ‘Batman & Robin’, Brian de Palma fez ‘Femme Fatale’ depois de ‘Os Trapaceiros da Loto’, John Carpenter fez ‘Vampiros’ e ‘Fantasmas de Marte’ depois de ‘Fuga de Los Angeles’ e ‘A Vila dos Amaldiçoados’... o problema maior será ele ter a modéstia necessária para ver o que anda errado com seus filmes e consertar isso. Ele não pode ter desaprendido a dirigir atores e a escrever roteiros de uma hora prá outra...


HORRORES DA BBC

Uma das melhores coisas de poder baixar filmes pela internet é achar obras que nunca chegariam às minhas mãos pelos ‘caminhos normais’ de distribuição... filmes orientais que não chegam aqui nem à tapa, seriados de TV que não chegam por aqui... e, em meu caso específico, as minisséries da BBC que não tem lá muita perspectiva de darem as caras por nosso país em um futuro breve. Nesse caso se encaixa a excepcional ‘O Dia dos Triffids’. Já nos créditos vemos que as coisas vão ser diferentes... ‘O dia dos Triffids, de John Wyndhan’... deixa claro que pelo menos vai se tentar seguir o livro, o que não se tentou na paupérrima adaptação cinamatográfica dos anos 60. E realmente, até para a surpresa dos fãs de livros de ficção científica que nunca são adaptados direito para o cinema (ou, neste caso, para a TV), segue-se a estrutura do livro, muitas vezes segue-se até os diálogos do livro. Ótimo. Vê-se, finalmente, o apocalíptico livro de Wyndhan ser adaptado para a telinha.

Tudo no ‘padrão BBC’, espartano (16 mm em cenas externas e videotape em cenas de estúdio), com efeitos modestos, até meio furrecas nesses tempos de efeitos perfeitos em CGI, mas com ótimo padrão de atuações, e com o clima pesado e apocalíptico que os leitores da obra de Wyndhan sempre quiseram. As quase três horas de projeção ajudam também a dar profundidade aos fatos, algo impensável para qualquer adaptação cinematográfica desta obra... ótimo

APOCALIPSE

Um dos lançamentos mais surpreendentes do ano é ‘O Apocalipse da Liga dos cavaleiros’... digo surpreendente pois foi lançado no Brasil sem que a série original, ‘A Liga dos Cavaleiros’, tenha saído por aqui... a série, da BBC, que durou duas temporadas e depois deu origem a shows de teatro, era uma grande gozação com os filmes britânicos de horror, girando em torno de um culto pagão que seqüestrava estranhos para sacrificá-los e garantir vida eterna aos ‘locais’... sem saber isso, o filme fica quase incompreensível. Toda hora eu tinha que explicar para a Luciane com o que eles estavam brincando, com o que eles estavam tirando barato... numa comparação forçada, é como se fizessem um filme inspirado nos personagens do Casseta e Planeta, e ficassem o tempo inteiro fazendo menções a eventos ocorridos na série... eu, que conhecia a série, adorei, mas não duvido que quem não conhece os personagens ache tudo muito sem graça e estranho...


Comments:
Os Trapaceiros da Loto?! que filme é esse? tem um com o Michael Keaton, mas não é do De Palma...
 
Renato, com qual nome saiu 'Wise Guys' aqui? É nesse que eu estou pensando...
 
"Quem tudo quer, tudo perde".
 
Caro Thomaz, como eu já te disse em algumas outras ocasiões, concordo contigo: "Miami Vice" é um filmaço, uma verdadeira lição de cinema. A forma como imagem e música se entrelaçam é tremendamente inspirada, um triunfo de edição. E Colin Farrel está brilhante. Na minha modesta opinião, é o melhor filme do ano, seguido logo depois de "Viagem Maldita".
 
Thomaz, só uma correção: desde Psicose o Doyle fotografou varios filmes ocidentais (para Barry Levinson, Philip Noyce James Ivory, etc).
 
THÔMAZ!!! THÔMAZ!!! :)
Nem sabia que vc tinha este blogue!
Maneiro cara! Vou ver se acho o dia dos trifits que vc recomendou.
Grande abraço!
 
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